*Por Hortênsia Nunes B. de Oliveira
Semana passada iniciamos nossa conversa com os seguintes questionamentos: Até onde chega o nosso parentesco? Seriam “primos” aqueles que fazem parte das histórias familiares legalmente nossos parentes? Esclarecemos vários pontos, e apresentamos curiosidades acerca do parentesco. Além disso concluímos que os conceitos legais destoam do popular, pois quem diria que nossos irmãos não são parentes de primeiro grau? (Para você que não viu: https://blogdovanguarda.com.br/sao-seus-parentes-mesmo/)
Partindo do pressuposto que compreendemos como é legalmente configurado o parentesco, podemos seguir nesse raciocínio e evoluirmos um pouco mais. Os questionamentos seriam: diante das diferenças práticas e legais do parentesco, quais seriam seus pontos relevantes? Qual a real importância do termo? O que essas relações interferem no direito?
Logicamente entendemos que tais definições possuem extrema importância e seus reflexos atingem diversas áreas e geram inúmeras consequências no âmbito jurídico. Mas quais são esses reflexos?
Como ponto de partida, podemos mencionar o mais atual, o direito eleitoral. Neste, podemos observar os casos de inelegibilidade fundamentadas no parentesco, ou seja, as hipóteses em que o sujeito não pode ser eleito para cargo político. A nossa carta magna trata expressamente dos direitos políticos, e traz normas gerais quanto a inelegibilidade.
No parágrafo 7º, do art. 14 é mais específica quando alude que são inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. Como visto, a Constituição Federal atesta que alguns parentes não poderão concorrerem a eleição de cargos ocupados por seus parentes, assim, o filho do Prefeito reeleito da cidade X não poderá se candidatar à prefeito na eleição subsequente.
Continuando na esfera constitucional, podemos destacar que um princípio amplamente conhecido é o da impessoalidade, este fundamenta a vedação da nomeação de cônjuges, companheiros, parentes em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, para o exercício de cargo, emprego ou função de confiança na mesma pessoa jurídica da autoridade nomeante. Desta forma, a nomeação destes parentes da autoridade nomeante infringe a Constituição Federal, bem como nomeação de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Além disso, essa previsão não exaure todas as hipóteses legais de nepotismo, dada a impossibilidade de se preverem todas as hipóteses.
Pulando para o âmbito civil, o parentesco também tem suas implicações. O código processual vigente traz disposições que estipulam hipóteses de impedimentos e suspeições, ou seja, causas que dizem a respeito da imparcialidade do juiz no exercício da sua função. As primeiras são hipóteses em que ao juiz é vedado o exercício de sua função no processo, há uma presunção absoluta da parcialidade do juiz, já na segunda, ou seja, na suspeição há uma presunção reativa, pois, a vontade do juiz pode restar atingida por algum elemento de índole subjetiva.
Nesses casos mencionados o parentesco é extremamente significante por atingir a imparcialidade do juiz de forma nítida, havendo por exemplo hipóteses de impedimento quando qualquer das partes for sua credora ou devedora, de seu cônjuge ou companheiro ou de parentes destes, em linha reta até o terceiro grau, inclusive.
Além destas implicações, existem outras como o impedimento do cônjuge, do companheiro ou de qualquer parente do morto, consanguíneo ou afim, em linha reta ou na linha colateral em segundo grau, ser citado, no dia do falecimento e nos 7 (sete) dias seguintes, ainda quando certos parentes são impedidos de serem ouvidos como testemunhas no processo etc.
Como vimos, o parentesco enseja várias consequências na seara jurídica. Os exemplos apresentados são pontuais ante a extensão da temática. Entretanto esse conhecimento ora repassado nos dá base para que possamos embasar nossas noções. No dizer de Caio Mário da Silva Pereira, o parentesco é a mais importante e a mais constante das relações humanas, “seja no comércio jurídico, seja na vida social”. Com isso, a ponderação dos efeitos do parentesco mostra-se necessária para que possamos ter uma noção básica do liame entre vida pessoal e seus efeitos legais.
*Hortênsia Nunes Braz de Oliveira é Advogada, Pós-Graduada em Direito Processual Civil e Direito Tributário e Membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico- OAB/Caruaru