Por Hortênsia Nunes Braz de Oliveira
Nos termos legais, o consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final e, além disso equipara-se a ele a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo – como já tratado anteriormente nesta coluna https://blogdovanguarda.com.br/semana-do-consumidor/. Mas, de forma muito mais ampla que um conceito existente na norma, o consumidor é um sujeito de direito com nítidas proteções dadas pelo legislador, fundamentado na busca pela isonomia e na Constituição Federal.
Surgiu ao longo dos anos uma preocupação com a vasta concessão de crédito ao consumidor, sem que se analise se ele possui ou não renda mensal suficiente para arcar com as dívidas. A concessão do crédito sem a realização da análise pode gerar, consequentemente, o superendividamento. Passou-se a observar a crescente do número de famílias com dívidas, as quais em julho totalizaram cerca de 70%, segundo a Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), realizada pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
Visto isso, foram propostas alterações no Código de Defesa do Consumidor, bem como no Estatuto do Idoso, com o intuito de afinar o tratamento dado ao consumidor ao e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento, entre outras coisas. Esta proposta visava proteger o consumidor do superendividamento, já que propunha a regulamentação da disponibilização do crédito, deixando a sua concessão mais responsável. Assim, os credores seriam obrigados a terem mais cuidado com os consumidores na hora do fornecimento do crédito.
Um desses projetos foi aprovado e se transformou na Lei N° 14.181/21, que ficou conhecida como a lei do superendividamento, e está em vigor desde o dia 02 de julho de 2021. Para esta, o superendividamento “é a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação.”
Como ponto inicial, a norma pôs como novos princípios o fomento de ações direcionadas à educação financeira e ambiental dos consumidores, bem como a prevenção e tratamento do superendividamento como forma de evitar a exclusão social do consumidor. Além disso, como novos instrumentos, sendo eles: a instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural; e a instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento.
Destacamos ainda um novo direito que foi atribuído ao consumidor, que é a garantia de práticas de crédito responsável, de educação financeira e de prevenção e tratamento de situações de superendividamento. Sendo assim, o consumidor (pessoa física) deverá ter conhecimento e principalmente entender de suas finanças para que tenha seu mínimo existencial garantido, e não atingido por dívidas. Para isso, além do conhecimento, da informação, pode ser inclusive repactuada a dívida e concedido novo crédito, a depender da situação e necessidade.
Um dos pontos principais dessa lei é que passou a existir a possibilidade do consumidor requerer a repactuação de dívidas, com a consequente elaboração de um plano de pagamento dos débitos com o prazo máximo de 05 dias, que mantenha equilíbrio com a renda e sejam preservados o mínimo existencial, as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. Não obtendo o resultado esperado com a conciliação, o consumidor poderá solicitar ao juiz a instauração do processo por superendividamento para que seja realizada a revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório, assim, o juiz poderá estipular o plano de pagamento.
A lei é de cunho importantíssimo para a nossa realidade. Tudo foi realizado levando em consideração que a boa-fé deve prevalecer e assim, se pressupõe que quem está endividado ficou nessa situação “acidentalmente”, seja por falta de conhecimento ou imprevistos, assim quem ficou com dívidias não agiu de má-fé. Portanto, enfatiza o dever da prevenção das dívidas e trata de roteirizar o surgimento destas para que possamos analisá-las, preveni-las e tratá-las. Além do que incentiva a educação financeira, que nos trará benefícios no decorrer do tempo. O incentivo aos meios alternativos de soluções de conflitos, com a facilitação da composição, é um ponto marcante e em regra promissor.