Ao assumir o governo, o presidente Bolsonaro alçou Paulo Guedes ao patamar de uma espécie de “Primeiro Ministro da Economia”. Como Bolsonaro não demonstrava possuir traquejo no trato da pauta econômica, nem apresentava esforço em adquirir tais atributos, todas as perguntas e formulações da econômica passaram a ser feitas e conduzidas pelo “Posto Ipiranga”. O “Posto Ipiranga” Paulo Guedes, também chamado de “Supre-Ministro”, teve carta branca do mandatário presidencial de ocasião não só para formular a política econômica do governo como também escolher o staff, as secretarias, chamadas pela impressa de super-secretarias, como a da previdência, orçamento, comércio exterior, privatização e produtividade, tesouro nacional e até o presidente do Banco Central. Ainda em 2018, Bolsonaro afirmava sua confiança em Paulo Guedes com a seguinte declaração: “Eu estou dando carta branca a ele. Tudo que é envolvido com economia é ele que está escalando o time. Eu só, obviamente, e ele sabe disso, estamos cobrando produtividade. Enxugar a máquina e buscar, realmente, fazê-la funcionar para o bem-estar da nossa população” (sic),
Guedes reinava absoluto e soberano na condução e controle da política econômica, apresentando uma política liberal, mas o seu reino mostra-se ameaçado por uma ala no governo ligada aos militares e apelidada de desenvolvimentista. A ala desenvolvimentista é liderada pelo ministro do Desenvolvimento Regional Rogério Marinho, que foi chamado por Paulo Guedes de “fura-teto”. Marinho, por sua vez, retrucou Guedes chamando-o de “pastor do deserto. Os desenvolvimentistas contam ainda com o apoio dos militares e dos ministros Tarcísio de Freitas e Braga Neto. A disputa consiste em definir qual visão econômica será a vencedora, a austera e liberal delineada por Guedes, ou a do Estado gastador em obras e programas sociais, representa por Rogério Marinho, Tarcísio de Freitas e Braga Neto.
O presidente, sem saber o que fazer, emitiu sinais confusos para onde irão os rumos da econômica. No primeiro momento, o Presidente disse que existe estudo para ultrapassar o teto de gastos (abrir os cofres do estado). Depois, por meio de mensagens nas redes socais, Bolsonaro defendeu o teto de gastos. Guedes, vendo ameaçada sua política econômica, sua posição e sobrevivência no governo, expôs a ferida e, em declaração de guerra à ala militar e desenvolvimentista, disse: “Os conselheiros do presidente que aconselham a pular a cerca e furar o teto vão levá-lo para uma zona sombria, uma zona de impeachment, de irresponsabilidade fiscal”.
Bolsonaro, por outro lado, só pensa em reeleição, pois vive de política há mais de 30 anos, e a escolha já foi feita, o presidente irá gastar, mas, para gastar, Bolsonaro deve equacionar o teto de gastos junto com a manutenção do Ministro Paulo Guedes no cargo, com ou sem prestígio, e que não seja visto como o presidente gastador. A agenda liberal perde espaço no governo com a saída de cinco integrantes do primeiro escalão da equipe econômica de Paulo Guedes, que classificou o momento como uma “debandada”. A debandada está ligada a um sentimento de frustração na implementação da agenda liberal.
Salim Mattar, ex-secretário de Desestatização, chegou a dizer, quando da sua saída do governo, que Bolsonaro não é um liberal. Disse o secretário: “Eu sou liberal, o Guedes é liberal. Ele não”.
A escolha pela implementação da política econômica baseia-se em definir qual o melhor caminho para garantir a reeleição do presidente, que já percebeu que “gastando” terá a popularidade jogada para cima, mas terá que flexibilizar o teto de gastos para abrir as porteiras, e isso pode virar uma bola de neve, criando um ambiente de desequilíbrio nas contas públicas, com o agravamento da situação fiscal, criando uma chamda contabilidade criativa e uma política fiscal expansionista, através de gastos públicos crescentes e desonerações fiscais, adotando uma meta de superávit primário insuficiente para conter o crescimento da dívida como proporção do PIB.
Seja qual for o caminho escolhido, ficamos com o sentimento muito bem apresentado no editorial da revista Época: “A população paga impostos nórdicos para bancar salários europeus no funcionalismo e recebe serviços dos piores países africanos”.