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Coluna Gente de Vanguarda

Na segunda parte da série sobre intelectuais negras da cidade, quem assume este espaço é Joana Figueirêdo, gerente da Secretaria de Direitos Humanos de Caruaru

Por Igor
29 de junho de 2020
A grande estreia de “Gente de Vanguarda” em nosso blog
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Joana Figueiredo

Ouçam a negritude

“Deus, por favor, quando eu crescer me faz como a Barbie!” [Joana, 6 anos]

“Quando eu crescer vou fazer uma plástica no nariz e alisar o cabelo.” [pensamento que pairava na cabeça de Joana dos 6 aos 15 anos]

“Joana, peça pra sua mãe prender seu cabelo. Fazer uma trança pelo menos.” [fala da professora de Joana quando tinha 7 anos]

“Professora, sabe o que eu vou ser quando crescer? Repórter! A professora olhando-me de cima para baixo, respondeu com uma risada irônica: – Só se for por um dia!” [Joana, 8 anos]

– Professora, o pessoal aqui da turma está me insultando por causa do meu cabelo que está solto.

– Também Joana, você vem com o cabelo desse jeito pra escola. [Detalhe, que eu só tinha ido de cabelo solto para a escola, porque ele havia apodrecido, de tanto que eu prendia molhado formando um coque. E minha mãe tinha me dito para não prender mais assim pois meu cabelo poderia cair].

– Posso ir em casa para ajeitar?

– Pode ir!

Como a escola era pertinho de casa, cheguei aos prantos e me tranquei no quarto. Tive vontade de nunca mais pisar na escola. Minha mãe veio me consolar. Disse que meu cabelo era lindo e que eu não ligasse. Culpabilizei-a por ter me incentivado a ir com o cabelo solto. [Joana, 12 anos]

Constantemente era insultada dentro do ônibus por sete garotas mais velhas de outra instituição escolar. Atacavam muito meu cabelo. Desciam primeiro que eu, e algumas vezes me ridicularizavam bem pertinho de mim. Quando desciam do ônibus muitas vezes jogavam areia e pedra pela janela. E depois que elas desciam eu chorava até chegar em casa. Quando chegava, me trancava no quarto, e prometia a mim mesma que jamais voltaria à escola. Escondi essa violência durante semanas dos meus pais, até que minha mãe percebeu a tristeza e a resistência de querer ir às aulas e tivemos uma conversa.

Destaco que todas as vezes que sofri racismo, minha mãe interviu. Ia até a escola, confrontava as professoras e exigia respeito. No episódio do ônibus, subiu numa parada antes da minha e conseguiu presenciar tudo. Interviu na hora e disse as jovens que se não parassem iria processá-las. Detalhe, que minha mãe na época era analfabeta, e também não conhecia a lei de racismo e injúria racial, mas sabia no seu íntimo que aquelas violências não eram aceitáveis. E em momento algum deixou de me defender, e de me dar forças para continuar a estudar. Essa Joana que está aqui hoje é graças ao companheirismo da minha mãe e do meu pai. Ambos interviam de formas diferentes, mas contribuíram muito na minha formação como pessoa.

Esses ataques racistas de lembranças tão latentes e nada cicatrizadas do período escolar reafirmam o quanto a escola reproduz desigualdades e o quanto ainda precisa-se avançar no que concerne o respeito às diferenças e enfrentamento de opressões, discriminações e desigualdades. E pasmem! Essas violências se deram em escolas públicas. Local onde se imagina haver uma empatia maior. Na minha época ainda não existia a Lei 10.639/2003, que estabelece obrigatoriedade do ensino de história africana e afro-brasileira. Nunca participei de uma discussão sobre enfrentamento ao racismo na escola e também não me recordo de ter visto em outros lugares. E, segundo apontam pesquisas acadêmicas a Lei 10.639 ainda não saiu do papel em muitos espaços educativos formais e a consciência negra só é lembrada e tratada na maioria das vezes em forma de projetos pontuais no dia 20 de novembro, e ainda muito por fora do que de fato é uma educação antirracista. E a consciência antirracista ao longo do ano todo?

Foto: Marília Chalegre

Essas lembranças me conectam ao livro “Quem tem medo do feminismo negro?” da filósofa Djamila Ribeiro, quando na introdução alavanca o tema “A máscara do silêncio”. Em um trecho ela narra que se sentia estranha e inadequada na escola. (Des)lugar onde era constantemente agredida na infância e adolescência por ser negra. Sentia vergonha de ser quem era, e se isolava. “Mas todo dia eu tinha que ouvir piadas envolvendo meu cabelo e a cor da minha pele.”

Sentimentos e sensações ruins recorrentes na vida de crianças e jovens pretas. Um sentimento de inadequação que o racismo estrutural nos impõe. Até a ideia profunda de achar que a nossa existência preta é um erro. Quando não é! O erro está na brutal colonização que esse país sofreu, quando inicialmente era habitado só por populações indígenas que também sofrem ataques e extermínios enquanto pessoas e enquanto territórios. Depois o abominável tráfico de negros(as) e africanos(as). E até hoje tais violências permanecem. Com outras performances e roupagens, mas ali e aqui gritando, oprimindo, escravizando, usurpando nosso ser, ceifando nossas vidas negras que IMPORTAM!

Ainda sobre o texto da filósofa Djamila Ribeiro, no seu lugar de fala, de quem sentiu e sente os inescrupulosos feitos das opressões, encontrei a seguinte frase: “Compreendi que existia uma máscara calando não só minha voz, mas minha existência.” E eu, como mulher negra, com registro de parda na certidão de nascimento, filha de mãe preta e pai branco, durante toda uma trajetória escolar de vergonha, inadequação, culpa e tristeza, consegui arrancar a tal máscara do racismo que me silenciava ao adentrar na Universidade. E depois de um processo intenso de (des)construção me descobri como mulher negra, e senti orgulho da mulher que lutei para ser.   Lugar onde conheci a verdadeira história do nosso país e das minhas ancestrais pretas escravizadas. Onde pude mergulhar no entendimento do que é de fato a Mãe África e o quão importante ela é para a humanidade, e quanta gente bonita esse continente tem. Hoje e sempre direi que nenhuma imposição eurocêntrica, racista, patriarcal e LGBTfóbica me mascara mais.

E esse empoderamento feminino negro, não é individual e sim coletivo. Ubuntu! Eu sou porque nós somos ! E a dor de ser mulher preta nessa sociedade violenta só sabe quem sente, e por isso a Dororidade entre as pretas. As histórias de dores se unem em histórias de resistências e companheirismo. Uma levanta e encoraja a outra. E como numa terra fértil, as sementes plantadas pelas nossas ancestrais vão florescendo. Assim como Marielle, que é de um tempo tão recente, mas que sua árvore vida, tantas sementes reverberou.

Por fim, a vocês leitores que chegaram até aqui, quero reforçar a reflexão de que, se você for pessoa negra/preta, a cada levantar exalte sempre a potência que é sua existência. E além de se levantar, ajudem na travessia da ponte as irmãs e irmãos pretos que por muitos motivos ainda se encontram alienados pela formação estrutural racista. Quando nos juntamos, no tornamos imbatíveis! E a você pessoa branca, que carrega o privilégio branco da imposição eurocêntrica e racista, pelo respeito à humanidade, tenha como tarefa de casa e da rua, as práticas antirracistas. Comece reconhecendo e problematizando seus privilégios e a distorção da superioridade branca. Dialogue com seus pares. Não se omita diante de “piadas racistas” e outros ataques. Não seja mais um algoz. Não bloqueiem as estradas para a negritude passar. Principalmente os espaços de decisão, de vez e voz. Leiam o que os pensadores negros falam sobre a luta antirracista. Leiam Djamila Ribeiro, Abdias Nascimento, Angela Davis, bell hooks e tantas outras vozes.

Atentem, ouçam, percebam e respeitem as vozes da negritude!

*Joana Figueirêdo é ativista, agitadora cultural e gerente da Secretaria de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos de Caruaru

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Maurício de Nassau – Caruaru

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Telefone: 81 3722.1818
E-mail: jornalvanguardacaruaru@gmail.com

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