Nunca foi tão necessário e vital o pacto federativo, ou seja, cada ente federado (união, estados e municípios), dentro de suas competências, atribuições, convergirem para o fim do estado, que é, em última análise, o bem comum.
Bolsonaro foi eleito como um político que iria descentralizar os poderes de Brasília, dando autonomia e independência aos estados e municípios. No discurso de posse, em 1º de janeiro, chegou a dizer que: “Pretendo partilhar o poder, de forma progressiva, responsável e consciente, de Brasília para o Brasil; do poder central para estados e municípios”.
Mas Bolsonaro esqueceu o discurso, reduzido-o a pó. E a pandemia o fez confirmar isso, um desejo de que Brasília (Governo Federal, Bolsonaro), não aceitaria de bom grado dividir o poder de gestão. Quando o Brasil realmente precisou de mais Brasil, Brasília reagiu mal. O presidente, de Brasília conflagrou uma briga fraticida com governadores e prefeitos, e traiu o seu próprio discurso.
Apesar de não apresentar nenhuma alternativa concreta, real, científica do que já vem sendo feito em termos de enfrentamento da pandemia, Bolsonaro sempre prega que está “impedido pelo STF de fazer qualquer ação em combate ao coronavírus em Estados e municípios” (pronunciamento feito em entrevista dada em 15 de janeiro de 2021).
O argumento do presidente de ocasião é mentiroso, falacioso e se mostra, no mínimo, revestido de má-fé objetiva.
No início da pandemia, em 2020, o que o STF decidiu foi que União, estados, Distrito Federal e municípios têm competência concorrente na área da saúde pública para realizar ações de mitigação dos impactos do novo coronavírus.
O modelo de saúde brasileiro desenhado nos artigos 196, 197 e 198, da Constituição Federal, estabelece que saúde é um direito de todos e dever do estado, e descentralizado, ou seja, a saúde brasileira possui uma gestão baseada em um pacto federativo, contemplando, em outra ponta, a participação da iniciativa privada na assistência à saúde.
A chamada lei do SUS, Lei n. 8.080, de 1990, no artigo 15, cuida de apresentar as chamadas competências comuns, ou seja, mais uma vez nos deparamos com a correlação entre descentralização e o pacto federativo adotados no Brasil, no quesito saúde.
Em resumo, temos um aparato legal e administrativo que determina o funcionamento do SUS de maneira descentralizada desde 1988, mas o discurso do presidente Jair Bolsonaro, de forma direta, contesta esse modelo tripartite de gestão da saúde, onde um ente complementa o outro.
A agenda e a fala do Governo Federal em 2020 era voltada para o chamado pacto federativo, vendido na frase, “mais Brasil e menos Brasília”. O vírus fez a pauta ser abandonada e o discurso ser esquecido. O que existe hoje é uma guerra entre União, estados e municípios, conflito esse levado aos tribunais.
Enquanto Brasília briga com o Brasil, o povo morre.
Verás que teus filhos temem e morrem,
Terra adorada!
Entre outras mil,
És tu, Brasil,
Ó Pátria amada!
Dos filhos deste solo és madrasta ingrata e hostil,
Pátria amada Brasil.